Neste momento, pelo menos é como eu sinto estas ocorrências atmosféricas, tudo é possível: o regresso de D. Sebastião (ainda que mumificado e sem grandes hipóteses de salvar seja o que for), uma invasão de seres de outra dimensão (como na história de Stephen King, "The Mist"), uma vingança centenária de almas penadas (como no filme "The Fog", de John Carpenter), espíritos confusos presos numa aprendizagem extra-física (como no filme "The Others") ou até o ressurgimento de uma ilha milenar, onde criaturas mitológicas habitam em harmonia com a magia e outros conhecimentos perdidos (como na lenda de "Albion", presente em contos merlinianos e demais fantasias).
Lamentavelmente, e sem qualquer desprimor para os temas acima (qualquer um deles mil vezes mais interessante que o que escolhi para o devaneio de hoje), resolvi trazer à pedra um efeito conhecido por muitos de nós, senão por todos, ainda que talvez com outros nomes: o efeito rebound (ou ressalto, em tuga).
Para os mais futebolisticamente inclinados entre vós, tratar-se-ia de uma bola que por força de algum impedimento, ressalta num defesa e volta aos pés da equipa atacante, de forma a permitir uma segunda hipótese de conversão - para os amantes encalhados, acaba por significar uma liana de salvação, alternativa bem melhor que a queda no vazio amoroso.
Quantos de nós não viveram já, em qualquer momento da nossa vida sentimental, a desilusão de um abandono, a tristeza profunda de termos sido trocados/preteridos/abandonados/esquecidos/traídos (riscar o que não se tenha aplicado, porventura) pela pessoa em cujas mãos tínhamos depositado o nosso coração frágil?
Quantos de nós não se sentiram desamparados nesse momento, emocionalmente descompensados, como se nos tivessem tirado o fôlego, o vulgar "murro no estômago", sem saber se voltaríamos a poder confiar, duvidando se alguma vez o pobre músculo cardíaco voltaria ao fulgor de outrora, pondo em causa para sempre o amor enquanto coisa belíssima e pura que sempre tinha sido para nós?
E por fim, quantos de nós ergueram muros altíssimos, barreiras à volta dos nossos sentimentos macerados e punimos indiscriminadamente todos os que não mereciam (família, amigos, colegas e nós próprios), com o nosso semblante carregado, a melancolia no olhar, a amargura nas palavras e a rispidez nos actos mais simples?
Pois bem, foi para evitar este triste estado de coisas que alguém inventou, há milhares de anos, o "rebound"; desde a altura em que o último dos Neandertais viu a sua companheira trocá-lo por um Cro-Magnon todo chique, e pensou,de lágrima no olho: "Que se lixe, já não achava piada nenhuma aquela macaca, de qualquer das formas...", ressaltando de imediato na direcção da primeira fêmea bípede que encontrou - esta história é verídica e deu origem, nos tempos modernos, a personalidades como a Júlia Pinheiro e algumas halterofilistas de países de Leste.
Resumindo, nos dias de hoje, os homens e as mulheres desventurados buscam consolo em regaços cuja proximidade se sobrepõe, amiúde, à estabilidade emocional e aos sentimentos de continuidade e coabitação.
Em termos de sabedoria popular ocorrer-me-ia o "tudo o que vem à rede é peixe", "mais vale um pássaro na mão do que dois a voar", "a cavalo dado não se olha o dente" - tudo, portanto do mais elogioso que dar se pode; a pessoa que se segue seria comparável a um peixe, uma ave ou um equídeo - bestial...
Mas é um facto, mais que assumido, que são essas relações que impedem, pela sua natureza de substituição de objecto de afecto, pelas suas características compensatórias, que nós caiamos totalmente em nós (o que para além de ser um paradoxo, deve ser extremamente doloroso) e nos apercebamos que ficámos, oficialmente, na m***a, sem apelo nem agravo.
Infelizmente, porque tudo tem um lado mau, este esquema tem muitos senãos (pelo menos meia-dúzia, em opção ou cumulativamente):
1 - a transitoriedade tem sempre um fim, forçando-nos a encarar novamente uma despedida;
2 - a outra pessoa acaba por sair magoada por não se ter apercebido que estivemos somente a usá-la como bóia de salvação;
3 - nós acabamos por levar na tromba depois da hipótese anterior;
4 - nós acabamos por sair magoados porque a outra pessoa também nos estava a usar como bóia de salvação e entretanto descobriu o amor - noutro lado;
5 - nós não crescemos enquanto pessoas porque não demos tempo suficiente ao "luto da relação anterior" (também chamado "fossa", "depressão" ou "ensaio para suicídio");
6 - nós passamos a vida a saltitar de compromisso em compromisso, como andorinhas do mar, com medo de pousar e nunca mais voltar ao ar.
Em jeito de conclusão, acaba por ser mais um aforismo que vem à memória, "preso por ter cão, preso por não ter"... Ainda assim, muitos são os que crêem que o rebound é absolutamente necessário para repor os nossos níveis de auto-estima em valores aceitáveis, permitindo-nos posteriormente entrar numa nova relação com as feridas saradas e sem bagagens excessivamente opressivas sobre os ombrinhos, um pouco como o efeito: dor de cabeça, uma aspirina... E já se pode apreciar a vida novamente.
Por já ter estado dos dois lados desta cerca, deixo aqui um conselho: não brinquem com os sentimentos das pessoas e deixem sempre bem claro em que estado levam o coração antes de começarem a correr - ninguém quer ter mais um AVC sem pré-aviso, ok?
Fiquem bem e uma óptima semana ;)